terça-feira, 3 de julho de 2012

Apenas uma Noite [2010]



(de Massy Tadjedin. Last Night, EUA, 2010) Com Keira Knightley, Sam Worthington, Eva Mendes, Guillaume Canet. Cotação: **

Chegou com um atraso medonho nos nossos cinemas esse mais novo trabalho Massy Tadjedin, estreando como diretora após conquistar certo prestígio como roteirista de “Camisa de Força” (2005), filme que também tinha Keira Knightley no elenco. Com o intuito de trazer situações destoantes acerca da infidelidade, “Apenas Uma Noite” faz com que não saibamos ao certo o porquê muitos desses jovens cineastas querem ganhar a atenção do público (e não seria falsa pretensão dizer que eles também desejam reconhecimento artístico), mas sem trazer algo de relevante dentro daquilo que está parecendo propor no próprio trabalho. Desperdício total de talento, o que não deixa de ser lastimável.

Numa Nova York filmada em Londres, conhecemos um jovem casal que está casado há três anos. Ele é Michael (Sam Worthington, de “Avatar”) , um homem de negócios, prestes a viajar para Filadélfia por conta de compromissos profissionais. Ela é Joanna (Keira Knightley, de “Um Método Perigoso”), uma jornalista freelancer que se encontra até mesmo insegura pelo fato do marido está indo viajar com uma colega chamada Laura (Eva Mendes, de “Dia de Treinamento”), a quem ela considera tão atraente, que chega a ser um perigo. Mas durante a ausência do marido, ela se reencontra com Alex (Guillaume Canet, de “A Praia”), um escritor francês com quem se relacionara no passado, e parece ter reacendido o interesse de Joanna por ele. 

Por começar de uma forma até promissora, fica nítido que “Apenas uma Noite” estava querendo se garantir numa coisa até bem simples: conquistar o interesse do público até o fim, só pra saber se a traição de Joanna ou Michael será, de fato, consumada. O jogo é somente esse. Qualquer movimento dos olhos, uma fala aguardada e atitudes dos personagens, ficamos prestando atenção para saber se será confirmado aquilo que tanto torcemos para que não aconteça (ou não). Alguns casais podem até se identificar, seja na insegurança tão humana da personagem de Keira, ou com a luta contra os seus próprios instintos travada por Michael. Independente das situações, dizer que se identificou com o filme no todo não será algo que você falará por muito tempo, acredite. 

Reconheço a tentativa até bem vinda de desenvolver os quatro personagens. A personagem de Eva Mendes, por exemplo, ganha voz, nem que seja para dizer como ela mesma não se arrisca a se responsabilizar pelos próprios atos, entregando-os ao acaso. Mas, por outro lado, a vã preocupação em garantir contornos aos personagens pode ter feito com que a roteirista-diretora não desse conta do recado quando se trata de direção de atores. Keira está mega apagada (diria que fez um quase regresso para a época que ainda era uma mocinha inexperiente), Sam Worthington é um eterno homem de cera, Eva Mendes... bem... continua linda, e Guillaume Canet (que foi recentemente pai do filho de Marion Cotillard), possui um carisma forçoso.

Com todas essas potências (discutir infidelidade entre adultos e personagens desenvolvidos), mas que, por outro lado, chega a ser decepcionante e com o elenco enfraquecido, é que vos digo que, quando se trata de “Apenas uma Noite”, os grandes traídos dessa história toda somos nós mesmos. 


terça-feira, 26 de junho de 2012

Hannah e Suas Irmãs [1986]

poster filme hannah e suas irmãs woody allen 1986

(de Woody Allen. Hannah and Her Sisters, EUA, 1986) Com Mia Farrow, Michael Caine, Barbara Hershey, Dianne Wiest, Carrie Fisher, Max von Sydow, Julia Louis-Dreyfus, Maureen O'Sullivan, Woody Allen. Cotação: *****

Filme de Woody Allen sobre três irmãs inteligentes e com crises familiares. Mesmo parecendo improvável, se você, por algum acaso, pensou em “Interiores”, você merece os parabéns, porque deve ser um fã bem conhecedor da obra de Woody Allen. Mas “Hannah e Suas Irmãs”, apesar de ter justamente esse mote resumido em comum, não tem nada a ver com o pesado filme de 1978. Aqui, o que vemos é um drama cômico (está longe de ser uma comédia) com um dos melhores roteiros de nosso mestre que, segundo o próprio, foi fisgado pelo livro “Anna Karenina”, de Léon Tolstoi (1828-1910). Também foi um dos maiores sucessos de bilheteria de Allen. Marca que só foi desbancada pelos mais recentes “Ponto Final - Match Point” (2005) e “Meia-Noite em Paris” (2011).

Com uma belíssima condução de roteiro, somos apresentados às três irmãs que conduzem a história. Hannah (Mia Farrow, de “Simplesmente Alice”), a mais velha, é uma atriz teatral de sucesso casada com o galanteador Elliot (Michael Caine, “Regras da Vida”). Outra irmã é Lee (Barbara Hershey, de “Cisne Negro”), que está emocionalmente confusa por conta de um inesperado relacionamento com o marido de Hannah, a sua própria irmã. Lee é casada com Frederick (Max Von Sydow, de “O Exorcista”), seu ex-professor. Por último, ainda tem a problemática Holly (Dianne Wiest, de “Edward Mãos de Tesoura”), uma ex-viciada em cocaína que tenta encontrar talento para ser uma atriz da Broadway ou fazer seu restaurante dar certo.

Em meio a isso tudo, Woody Allen interpreta Mickey, ex-marido de Hannah. Ele - como todo hipocondríaco - se desespera pela chance de ter um tumor cerebral após perceber que está perdendo a audição em um dos ouvidos. Woody faz, portanto, um filme para si em meio à conturbada relação de Hannah e suas irmãs, sendo responsável pelo alívio cômico. Tem até piadas que funcionam (graças à Allen, claro), mas de modo geral, às cenas mais complexas, como o término da relação entre Lee e Frederick, são a prova de que “Hannah e Suas Irmãs” tem mais camadas do que podíamos imaginar. Voltando a falar do personagem de Woody, a prova de que ficou com ele os melhores momentos do longa é a sua busca por um sentido na vida, onde ele acredita estar na religião. São visitas a padres e hare krishnas, para desespero de seus pais, judeus de tradição.

Partindo para o lado mais dramático da coisa toda, “Hannah e Suas Irmãs” ressalta os riscos que o amor pode representar, graças às armadilhas do nosso coração. Podemos ser felizes atualmente, mas de forma inesperada, poderemos nos envolver com outra pessoa, ou sermos vítimas de uma traição que poderia até ser chamada de “justificável”, mas o próprio filme deixa transparecer que tudo pode ser uma questão de situações criadas. Nós somos totalmente responsáveis por nossos atos, mas o que nos empurra - ou nos contêm - são os acasos. Esses que nos levam ao imprevisível. E é bem isso que nos é mostrado por “Hannah e Suas Irmãs”, um filme que segue a vida dessas mulheres por dois anos, sempre marcado pelas estações do ano tão vivas de Nova York, e os jantares de Ação de Graças. 

Tudo isso é seguido em um filme sem fluxo contínuo, com direito a flashbacks (a edição do filme é espetacular). Outro elogio que não tem como deixar de fazer diz respeito ao elenco. Até Mia Farrow (que muitos consideram fraquíssima) está bem no filme. Dianne Wiest ganhou até Oscar pelo papel, assim como Michael Caine. Wiest, aliás, ganharia sua segunda estatueta poucos anos mais tarde, por “Tiros Na Broadway”, onde também foi dirigida por Woody Allen. Até Max Von Sydow, que aparece bem menos do que eu desejaria, faz um trabalho esplêndido (como na já citada cena do término). Imagino o nervosismo de Allen ao dirigir um grande ator de Bergman, um dos diretores que ele mais venera.

Para terminar com uma curiosidade, em uma das cenas de Ação de Graças, algumas crianças que aparecem são realmente filhos adotivos de Mia Farrow (no filme ela é mãe de quatro). Uma dessas crianças é a coreana Soon-Yi Previn, que mais tarde se tornaria esposa de Woody Allen, numa polêmica relação que dura até hoje.