segunda-feira, 4 de julho de 2011

Carne Trêmula [1997]


(de Pedro Almodóvar. Carne Trémula, Espanha, 1997) Com Javier Bardem, Francesca Neri, Liberto Rabal, Ángela Molina, José Sancho, Penélope Cruz. Cotação: *****

Em meados dos anos 90, Pedro Almodóvar era até então conhecido como um dos poucos cineastas capazes de criar um universo folhetinesco e bem humorado em seus filmes, com personagens femininas surreais, como é mostrado, por exemplo, em “Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos” de 1998. Mas foi a partir de “Carne Trêmula” (a maioria dos cinéfilos poderão dizer que foi com “A Flor do Meu Segredo”, de dois anos antes) que Almodóvar emprega uma mão mais madura, com um sentimentalismo aflorado através de histórias que custamos a acreditar, tamanha a inteligência nas formas como ele enlaça seus personagens, numa trama que nos mantém interessados no que vai suceder em todos os momentos. Tudo isso sem abandonar seu estilo visual que sempre lhe foi característico.

Atenho-me nos poucos detalhes que posso dar sobre o enredo, porque se trata de um filme em que, quanto menos saibamos sobre os personagens, melhor. O que poderá ser dito é que a vida do jovem entregador de pizza Víctor Plaza (Rabal) cruzará de maneira integral com o a do policial David (Bardem) e seu parceiro Sancho (Sancho), que mantém sua esposa Clara (Molina) sob sua austeridade. E a de Elena (Neri), a quem Victor fica perdidamente apaixonado após uma única transa – quase anônima - ocorrida num lavabo.

Fatalidade, amor, desespero, medo, redenção, culpa, ciúmes, ira e prazer. São somente alguns elementos que Almodóvar utiliza em um único filme para manter seus espectadores sempre ligados. E não faz feio. Num enredo praticamente perfeito, o único momento em que nos damos conta de que estamos fora daquela história se dá nas passagens em que tiramos lições para as nossas próprias vidas. Sim, isso é possível, afinal, um filme no mínimo competente deve nos proporcionar esse auto-diálogo, nos fazendo refletir, sem precisar que nos desinteressemos pelos personagens da obra.

Impressionamos-nos com o tamanho minúsculo do espaço histórico do filme. São moradores de Madri que têm as suas vidas cruzadas de uma forma orgânica, limpa. A partir daí, são laços. Um se dando conta que a vida do outro pode ser remediável, mas jamais a sua própria. E mesmo sem eu ter falado uma das grandes questões do filme, é pertinente buscar saber o que seria a culpa no contexto da história. Culpa essa que vai passando de mão em mão. De caso em caso. Os personagens proporcionam ótimos diálogos. Em um deles, podemos ver o personagem de Javier Bardem (ainda pouco conhecido e simplesmente fantástico) questionando o amor de sua esposa, dizendo que ela possui “uma sinceridade que chega a ser insultante”, e que por conta disso, vai continuar explorando a culpa que ela sente. Vale dizer que esse detalhamento faz muito mais sentido para quem já assistiu ao filme.

Almodóvar, mesmo em terras recém exploradas – o drama escancarado – não abre mão de seu talento estilístico. A cena do parto no ônibus, com tomadas distanciadas, é exemplo da qualidade técnica do diretor, além dos momentos de sexo tórrido, onde são vistas somente as silhuetas dos atores. As cores berrantes estão mais contidas, mas a boa trilha sonora e a homenagem que ele faz à força feminina estão bem vivas. Dessas mulheres fortes, uma delas é encarnada por Penélope Cruz, numa ligeira participação, interpretando a mãe de Victor (anos mais tarde, a parceria com Almodóvar seria mais bem trabalhada em “Abraços Partidos”).

É chato dizer sempre que um filme é excelente somente por conta do seu diretor/criador. Mas no caso de “Carne Trêmula”, depois da experiência de assisti-lo, não tem como fugir desse tipo de elogio.

3 comentários:

  1. É o filme de Almodóvar que mais me toca. A Angela Molina está comovente e a introdução do filme é perfeita. Sem contar a fotografia fenomenal do brasileiro Affonso Beato.

    O Falcão Maltês

    ResponderExcluir
  2. Sou grande admiradora do Almodóvar, "Carne Trêmula" é um filme vivo, pulsa de emoção!

    ResponderExcluir
  3. Preciso ver vários da vasta filmografia de Almodóvar. Este é um deles!

    P.s.: Preciso izer que este novo layout está incrívelmente lindo? Claro que não, né? hehehehe

    ResponderExcluir