sexta-feira, 6 de abril de 2012

Fale com Ela [2002]


(de Pedro Almodóvar. Hable con Ella, Espanha, 2002) Com Javier Cámara, Darío Grandinetti, Leonor Watling, Rosario Flores, Geraldine Chaplin. Cotação: *****

Pode parecer surpreendente, mas Pedro Almodóvar só foi indicado apenas uma vez para o Oscar, tanto como roteirista como diretor (é por estas e outras que a premiação, muitas vezes, não é levada muito a sério). E o filme que deu a chance de Almodóvar de ganhar a estatueta dourada foi justamente este “Fale Com Ela”. Curiosamente, é um dos meus preferidos do diretor espanhol (se não for o mais). Não que eu me influencie desta maneira com Oscar, mas acredito que ele é um dos mestres mais injustiçados da Academia, que está demorando a reconhecer o talento do cara e, enfim, condecorá-lo como diretor (ele ganhou apenas na categoria de roteiro), mesmo que ele sempre esteja lançando filmes excelentes. Mas parece que ele não está nem aí, e faz questão de provar que Oscar não faz falta pra ele.

“Fale Com Ela” tem uma trama tortuosa, e uma das mais belas que Almodóvar já contou. Trata-se de duas histórias que – como sempre – vão acabar se relacionando. De um lado, o enfermeiro Benigno (Javier Cámara) cuida de Alicia (Leonor Watling), uma paciente em coma há quatro anos, a quem ele parece manter uma paixão platônica desde o acidente de carro que a deixou em estado vegetativo. De outro lado, o jornalista argentino Marco (Darío Grandinetti), que escreve para o “El País”, se envolve com Lydia (Rosario Flores), uma toureira de sucesso que acaba se ferindo gravemente na arena e entra em coma profundo. No hospital, Benigno e Marco vão iniciar uma amizade repleta de confissões, cumplicidade e ligada pelo amor que sentem pelas mulheres que se encontram internadas.

É interessante notar, de imediato, a diferença primordial entre Benigno e Marco. Apesar de ambos estarem em uma situação parecida, os dois lidam com as trágicas conseqüências de maneiras diferentes. Benigno acredita que tudo pode ser revertido, e que o amor pode vencer qualquer barreira. Sua ingenuidade pode acabar custando caro. Marco, por sua vez, já é cético em relação a muitas coisas, inclusive na possibilidade de sua companheira acordar, ou até mesmo, na chance dela escutar no coma (o título da obra vem daí). Nessas diferenças, o resultado pode ser fatal: enquanto um está sempre ganhando, o outro está sempre perdendo. Mas o que determina quem ganha ou quem perde nessas ocasiões são as artimanhas do destino. E com destino Almodóvar sabe brincar e fazer bonito.

As viradas que a história dá e a amostra do que é se alimentar das paixões são características tão presentes no universo de Almodóvar, que tudo ali parece acontecer de forma natural. E sabemos que, no final da história, um auge inesperado e surpreendente poderá acontecer. Em “Fale Com Ela”, Almodóvar, que sempre se mostrou bom entendedor da mente das mulheres, trata do homem como vítimas de um amor vitimado pelo acaso. E as mulheres se mantêm fora do contexto principal na maior parte do tempo. Ou seja, o diretor e roteirista deixou calar (mas não completamente) as mulheres para dar chance de provar que a delicadeza masculina não só existe, como também se faz presente de uma maneira única. 

Almodóvar também insere dentro de seu filme um curta-metragem inesquecível sobre um homem que vai encolhendo, e acaba sendo acolhido por sua mulher, mas de uma forma bem curiosa (vale a pena conferir). Ainda tem a presença marcante de Geraldine Chaplin, filha de Charles Chaplin (1889–1977), interpretando a professora de balé de Alicia. “Fale Com Ela” também é um dos filmes mais “abrasileirados” de Almodóvar, que colocou Elis Regina na trilha sonora, e uma ponta de Caetano Veloso (a quem é amigo e admirador) cantando em uma cena que reúne grandes atrizes que são conhecidas pelos filmes com Almodóvar, como Cecilia Roth e Marisa Paredes.

Não tem como não gostar.

5 comentários:

  1. Adécio, Fale com Ela é uma obra-prima. Lendo essa sua otima frase, lembrei logo de um amigo que odeia Almodovar e esse filme...rs
    Tem maluco para tudo, nê?
    Grande texto. Almodovar é mestre!

    Abs!

    http://espectadorvoraz.blogspot.com.br/

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  2. Também é o meu preferido do Almodovar, simplesmente não me canso de assistir. Almodovar é um dos vários exemplos de injustiças do Oscar... o que vale mesmo é a propaganda, infelizmente.

    Essa cena do homem que encolheu é incrível, assim como todo o filme.

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  3. Talvez seja o filme de Almodóvar que eu menos goste.

    O Falcão Maltês

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  4. Eu me lembro que quando eu assisti a esse filme, fiquei extremamente estarrecido. Na verdade, o que mais me chocou foi: como foi possível criar uma personagem entrando na vagina da outra e, ainda assim, ainda que tão antinatural essa situação e esteticamente não muito bonita, ter ficado tão belo?. Trata-se mesmo de uma belíssima obra de Almodóvar e eu concordo plenamente com a sua análise acerca desse filme, gostei especialmente de como apontou as diferenças entre os personagens masculinos, haja vista que elas, as dinstinções, são fundamentais para o desernolar da obra.

    Ótimo texto.
    ;)

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  5. É meu segundo favorito do Almodóvar - ficando atrás apenas de Carne Trêmula. Verdade, uma obra realmente belíssima, poética e metafórica. Destaco a cena da boiada ao som de Elis Regine, que encanta por sua plasticidade incrível. Viva Almodóvar!

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