quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Reino Animal [2010]


(de David Michôd. Animal Kingdom, Austrália, 2010) Com Ben Mendelsohn, Joel Edgerton, Guy Pearce, Luke Ford, Jacki Weaver, Sullivan Stapleton, James Frecheville, Dan Wyllie. Cotação ****

"Reino Animal" reúne todos os elementos esperados em um filme alternativo. De baixíssimo orçamento, a obra não traz um título desses sem intuito algum. De modo geral, se trata de uma fábula contemporânea que utiliza a violência do subúrbio de Melbourne, na Austrália, como o hábitat de uma família inserida numa guerra urbana. Em meio a isso, encontra-se um jovem tão vulnerável quanto um cervo manco, assustado com uma ninhada insolente de irmãos que estão sob os cuidados de uma leoa, a matriarca de um grupo intolerante. É uma forma de interpretação explícita que todos (ou ao menos os cinéfilos) deveriam embarcar.

"Reino Animal" se inicia já de maneira estranha. O adolescente J. (James Frecheville) assiste TV enquanto paramédicos resgatam sua mãe, morta por overdose. Sem ter a quem recorrer, ele liga para sua avó, Janine ‘Smurf’ (Jacki Weaver), que o acolhe em sua casa, onde mora com os filhos Darren (Luke Ford), Craig (Sullivan Stapleton) e o mais problemático, Pope (Ben Mendelsohn). O que J. não esperava é que acabaria sendo jogado numa família enfrentando uma guerra entre policiais e bandidos. Em meio a esse conflito armado, um amigo da família, o assaltante de bancos Barry (Joel Edgerton) é morto, o que dá inicio a uma série de acontecimentos que estará fora do alcance de J. Pelo menos até que ele desperte. Do outro lado, está o honesto policial Leckie (Guy Pearce) que quer ajudar o garoto ainda não contaminado, assim o protegendo do perigo que seus tios e a avó representam.

O diretor estreante David Michôd se baseia numa história real para retratar essa família criminosa. De maneira bem sutil, ele nos eleva a uma capacidade de raciocínio interpretativo muito bem. Não que seja tarefa fácil. Michôd tem em mãos um trabalho que foi capaz de torná-lo queridinho dos festivais mundiais de cinema. "Reino Animal" talvez seja seu grande trunfo, uma pérola em meio a tantos filmes que se auto vangloriam por se utilizar do baixo orçamento como desculpa para um tratamento estético tão sujo. Michôd pouco se importa com os detalhes estéticos, concentrando-se no efeito causado pelo clima estranho que ele apresenta. E pelo menos nessa parte ele consegue êxito. A sensação que temos é que o personagem principal precisa ser caça ou caçador. Uma decisão emergente. E no final, após o discurso fantástico que o policial Leckie faz para a “vovó Smurf”, vemos quem é de fato o predador.

Muito se fala sobre a atuação de Jacki Weaver. Não poderia deixar de repará-la. Jacki encarna uma mulher de força incrível. Mas seus melhores momentos se encontram já no ultimo ato, quando o desfecho está em suas mãos. Sua conversa com o advogado da família evidencia que seu rosto exótico e seu olhar hipnotizante junto à sua fala mansa (mesmo quando profere planos diabólicos) ajudam para que sua maturidade profissional apareça. Todos do elenco, grande parte amadores, fazem um bom trabalho, em especial o britânico Guy Pearce, que também esteve muito bem em "O Discurso do Rei". É um ator que vem fazendo boas escolhas na carreira há um bom tempo.

“Todos são assustadores, mesmo que não demonstrem”, diz a narração em off de J., que é abandonada de maneira rápida pelo filme. Ou seja, os personagens são capazes de atitudes extremas sem nenhum impedimento. Mesmo cúmplice do toda a situação, J. é um exemplo clássico do cidadão que submete-se às provações. Claro que "Reino Animal" não serve como discurso para o “despertar da sociedade” (ainda bem). O que é relevante aqui é analisar como estão sendo usadas as diversas simbologias, através da história dessa família, comparada a vida de animais em seu meio natural. É um verdadeiro convite pra isso.

Quem quiser assistir sem essa pretensão, terá uma grande oportunidade desperdiçada.

Um comentário:

  1. Não tinha escutado nada sobre o mesmo, é sempre bom ver novas sugestõe e opções de filme, que pelo visto deve ser muito bom.

    Gostei do Blog.

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