quarta-feira, 9 de março de 2011

Bananas [1971]


(de Woody Allen. Idem, EUA, 1971) Com Woody Allen, Louise Lasser, Carlos Montalbán, Nati Abascal, Jacobo Morales, Miguel Ángel Suárez. Cotação: ***

Uma coisa é importante ser frisada: Woody Allen NÃO É um cineasta político, não tem pretensão para tal e NÃO DEVE ser confundido. "Bananas" certamente é uma obra que discute um problema histórico que está na configuração geopolítica de sua época: a questão dos movimentos revolucionários ocorrendo na América Latina, tendo como maior êxito a de Cuba, em 1959, que derrubou o ditador Fulgêncio Batista, liderado por um dos maiores ícones revolucionário do séc. XX - Fidel Castro. Aliás, Fidel serve até mesmo como base para uma paródia hilária de Woody, ao se utilizar de uma barba falsa e tentar discursar sem saber direito o que está falando, contrapondo-se com Fidel, um verdadeiro orador capaz de discursar horas a fio.

Fielding Mellish (Woody Allen) não tem o emprego dos sonhos. Ele testa engenhocas projetadas por inventores em prol do bem estar das pessoas. Certo dia, bate em sua porta a estudante de Filosofia Nancy (Louise Lasser), uma militante pedindo a ele sua contribuição para um abaixo-assinado. Ela defende a libertação de San Marcos, na América Latina, que se vê governada pelo ditador militar General Emílio Molina Vargas (Carlos Montalbán). Eles começam um relacionamento, mas Nancy o abandona porque falta liderança por parte de Fielding, mesmo que sua nova realidade seja aceitar pedidos de piquetes em embaixadas. De saco cheio, ele parte para San Marcos, e sem saber acaba entrando no meio de uma conspiração política. Seqüestrado pelos guerrilheiros, ele então participa ativamente da revolução, e após o líder Esposito (Jacobo Morales) enlouquecer depois da tomada de poder, ele se vê a frente de todo o Estado.

O que temos aqui são dois pontos bem acentuados do cinema de Woody Allen. O primeiro deles é a crítica social que ele faz com suas famosas cutucadas. Na abertura de "Bananas", podemos ver uma transmissão ao vivo de uma execução. O até então presidente da República de San Marcos é atingido por tiros em frente ao Palácio, em frente à população. Todo o ocorrido é mostrado em tempo real por câmeras, com direito à narração de repórteres, enviados diretamente por um canal de esportes (!) de forma inteiramente sensacionalista, assim como vemos tão comumente em “jornais” do mundo inteiro até hoje. Allen não poupa nem mesmo a Igreja Católica, ao produzir um falso comercial de cigarro intitulado “Novo Testamento”.

O outro ponto importante que Allen trabalha não só aqui, mas também em grande parte de seus filmes, é o tratamento teatral e cômico de suas chamadas “esquetes”. Logicamente, não se trata do primeiro filme em que ele faz isso, mas aqui é mostrada a base do que estaria por vir. "Bananas", digamos, seria o marco inicial do Woody Allen que se tornou referencialmente conhecido. Boa parte desses momentos funciona de maneira justa quando seu personagem passa para os treinamentos em campos rebeldes. Como não rir com cenas onde Allen tenta se camuflar e acaba sendo surpreendido por outro combatente urinando na sua tocaia? E não só. A cena na qual ele tenta comprar revistas pornôs disfarçando com revistas como National Review é engraçadíssima!

Outros pontos marcantes do trabalho de Allen começam a ser mostrado, como sua forma bem humorada de lidar com questões existencialistas, o divã, a insegurança crônica e reflexões envoltas em frases de efeito (“A liberdade é maravilhosa. Mas por outro lado, morrer por ela é um atraso para sua vida sexual”). O tratamento estético ainda não é dado o devido valor, passando a ser existente em suas obras a partir de seus próximos filmes. Mas suas influências herdadas fortemente por Chaplin e gags que inspiraram outros comediantes, fazem de "Bananas" um marco cinematográfico no ramo das comédias, ainda que muita coisa aqui seja ultrapassada e até caricatural demais.

Mesmo com um tema tão passível à discussão e interpretações desnecessárias sobre influências histórico-políticas, Allen não dá espaço para uma abordagem muito polêmica. Em meio a uma revolução, as torturas são feitas ao som de operetas (é duro de aguentar mesmo) e os discursos não contém um pingo de moralismo. TUDO é levado no bom humor e na canalhice, no melhor estilo escrachado, e é isso que o difere de Chaplin, que concede mais margens às interpretações mais militantes em suas obras. Woody quer mais é fazer de uma história permanente sirva de subterfúgio para seus excessos de trapalhadas. E por fim, ter como resultado um filme de comédia com nuances “cabeça” por trás. E nesse ponto, ele é infalível.

Curiosidades: No início do filme, Sylvester Stallone aparece em uma ponta não creditada interpretando um dos assaltantes no metrô. E na cena da revolução, o carrinho de bebê descendo as escadarias do Palácio é uma referência direta ao filme "Encouraçado Potemkin", clássico de 1925 do diretor Sergei Eisenstein.

4 comentários:

  1. Sou falho quanto ao cinema do Allen, assisti alguns titulos, mas "os principais" eu ainda estou em divida.

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  2. Muito bom o blog, Adécio. Vou linká-lo.
    Ontem revi NEBLINA E SOMBRAS, do Allen, um filme que gosto muito, principalmente pelas referências a Bergman e ao expressionismo alemão.
    Na fila de espera, SIMPLESMENTE ALICE. Aprecio muito a fase de Allen com Mia Farrow. É a minha favorita.
    Abraços,

    www.ofalcaomaltes.blogspot.com

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  3. nesse filme percebemos um Woody Allen amadureçendo, é um bom filme.

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  4. A cena do inico do filme é a melhor:

    "Estamos em San Marcos onde vamos lhe mostrar um assassinato ao vivo e a cores. Vão matar o presidente desse adorável país e vão substitui-lo por um ditador"

    Woody Alen não poderia ter expressado melhor a banalização e a indiferença como q o povo ianque tinha em relação as ditaduras na America Latina

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