sexta-feira, 17 de junho de 2011

Dzi Croquettes [2009]


(de Tatiana Issa e Raphael Alvarez. Idem, Brasil, 2009) Documentário. Cotação: ****

O que me faz pensar bastante sobre esse documentário (até agora um dos nacionais mais premiados) foi sobre a questão desafiadora do projeto encabeçado pela atriz Tatiana Issa e seu amigo de longa data, Raphael Alvarez. Residentes de Nova Iorque, eles projetaram praticamente sozinhos esse filme com o intuito de resgatar a memória de um grupo teatral de grande importância da cena artística carioca nos anos setenta, que conquistou grandes êxitos tanto aqui, quanto na Europa. Mas como um grupo de 13 homens que deram oportunidade para aflorar outros movimentos artísticos já nos anos 80 foi esquecido quase que completamente? Essa é uma questão que paira em todo o decorrer desse belo documento.

Dzi Croquettes (uma brincadeira com o artigo “the” e o fato de serem carnes comestíveis, portanto, croquetes) foi um grupo teatral liderado pelo americano Lennie Dale, um coréografo americano radicado no Brasil que se juntou com outros doze homens para reinventar a contracultura com um grupo andrógino. Apresentavam um espetáculo com irreverência, humor, dança e teatro. Pressionados pela repressão militar através de perseguições políticas, rumaram para a Europa, a fim de terem melhores espaços. Não foram compreendidos em Portugal e boicotados pela imprensa na França, mas graças ao apoio de Liza Minnelli, que se tornou madrinha do grupo, a alta sociedade conheceu as ousadas e incríveis apresentações dos rapazes, e assisti-los se tornou a coqueluche de Paris.

Fina ironia. Não existe termo melhor para designar Dzi Croquettes. Fizeram de uma maneira única peitar as repressões políticas de forma inteligente e sagaz. Eram homens que, apesar da homossexualidade escancarada, não faziam disso um subterfúgio para comporem um universo gay restrito, afinal, seus espetáculos poderiam ser assistidos e conseguiam emocionar qualquer pessoa suficientemente esclarecida para entender o que aqueles homens queriam passar. O grupo, que teve início em 1972, ano do primeiro espetáculo, acabou de forma banal por conta de uma briga interna. Dos 13 integrantes, 5 estão vivos, 4 morreram em decorrência da AIDS (até então uma doença desconhecida, chamada de “câncer gay”), 3 foram assassinados na Europa de forma brutal e até hoje não resolvida e um por conta de aneurisma.

Contando com vários depoimentos - dentre eles Elke Maravilha, Miéle, Gilberto Gil, Nelson Motta, Marília Pêra, Ney Matogrosso, Jorge Fernando, Cláudia Raia, Miguel Falabella, Pedro Cardoso, Liza Minnelli, Betty Faria, as Frenéticas, além dos remanescentes, Claudio Tovar, Ciro Barcelos, Bayard Tonelli, Rogério de Poly e Benedito Lacerda - “Diz Croquettes” remonta todo o sucesso da companhia que tinha como característica visual a força da feminilidade (com muitos glitter e plumas) representada por homens que não tolhiam suas características masculinas, o que intrigava muita gente.

Infelizmente, “Diz Croquettes” acaba caindo muitas vezes no engrandecimento gratuito e apelando para adjetivos que vão se repetindo e soam exagerados demais por um ou outro depoente, ao longo de um filme que exagerou um pouco no seu tempo de duração. Apesar de contestável no começo, as inserções de Tatiana Issa em primeira pessoa acabam ganhando uma finalidade condizente e emocionante apenas na conclusão, até porque ela tem propriedade e razões honestas para contar a história desse grupo que graças a ela e de uma rede de televisão alemã responsável pelo único registro em vídeo do espetáculo feito na França, tiveram sua memória devidamente resgatada. Um trabalho de admirável contribuição cultural.

3 comentários:

  1. Preciso ver este documentário, sempre fico bastante curioso quando leio uma crítica sobre ele. E seria uma boa pedida para conhecer o grupo que parecia (e, pelo visto, é) muito interessante!

    Cara, ficou lindo esse novo visual do blogue :D hehe

    []s

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  2. Não conferi este documentário, tenho uma defasagem enorme com o gênero que estou corrigindo aos poucos!

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  3. Fiquei impressionado. Vi duas vezes seguidas. Grandes artistas!

    O Falcão Maltês

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