quarta-feira, 6 de julho de 2011

Apocalypse Now [1979]


(de Francis Ford Coppola. Idem, EUA, 1979) Com Martin Sheen, Marlon Brando, Robert Duvall, Frederic Forrest, Sam Bottoms, Laurence Fishburne, Harrison Ford, Dennis Hopper. Cotação: *****

Foram aproximadamente quatro anos que o mestre Francis Ford Coppola levou para concluir esta que é um de suas obras-primas. Nesse meio tempo, ele enfrentou as intempéries de uma produção desse nível, como o alto custo que foi completado do seu próprio bolso, o desgaste físico e emocional, e o narcisismo de Marlon Brando, que se negava a colaborar com seu texto, além de fazer exigências de foco por conta da sua obesidade. O trabalho de Coppola rendeu. E o resultado é simplesmente um dos melhores filmes de guerra já produzidos na história do cinema (talvez o melhor no contexto da Guerra do Vietnã), e segundo o próprio diretor, “este não é um filme sobre o Vietnã. Este filme É o Vietnã”.

Baseado livremente na obra “Coração das Trevas” (1902) de Joseph Conrad (1857-1924), “Apocalypse Now” retrata o horror da guerra do Vietnã (1969-1975) sob a perspectiva do Capitão Benjamin L. Willard (Sheen), que após uma temporada solitária em Saigon, é procurado pelo alto comando do exército para uma missão inesperada. Ele terá que partir para o Camboja em busca do Coronel Walter E. Kurtz (Brando), um desertor que estaria montando uma milícia em meio à mata vietnamita. Willard parte para a missão a bordo de um barco com outros combatentes, que ele considera “jovens roqueiros com o pé na cova”. Enquanto segue a viagem, enfrentando todos os tipos de perigos, ele investiga a fundo a história de Kurtz, que teria feito uma carreira praticamente exemplar.

A guerra não teria um modo mais explícito de ser retratado como é aqui em “Apocalypse Now”. A temática, na verdade, nunca chegou a envelhecer, afinal, estamos tratando de uma situação onde os americanos (costumeiramente patriotas) estão impondo seu domínio de uma forma insana. Do repúdio aos vietcongs à idolatria do seu poderio bélico, os personagens são um retrato de uma geração que, de fato, existiu e ainda faz questão de se mostrar existente. O personagem de Robert Duvall (fantástico no papel), o Coronel Bill Kilgore, é capaz de dizer que adora “o cheiro de napalm pela manhã”. A razão parece ser óbvia, napalm - para ele - é resultado direto da vitória e supremacia americana.

Mas as conseqüências desastrosas da guerra (além da dizimação de sociedades inteiras, é claro) podem ficar para os próprios americanos que estão dentro dela. Os soldados enfrentam um grau de estresse tamanho, que mal se dão conta da crueza de suas missões. “Apocalypse Now” é excelente, principalmente, por nos convidar para o desconhecido, tanto para nós, quanto para os próprios personagens principais. A insanidade daquela situação, além de todos os momentos de extrema tensão, sem saber o que estará por vir, é uma das maiores provas da atemporalidade desse filme, pois ainda sabemos que o desconhecido, nesse contexto, não é fácil de ser mostrado de uma forma perturbadora.

Mas o que seria a insanidade da guerra? Por que Kurtz teria partido para “métodos irracionais”? Coppola, durante todo o filme, mostra que métodos irracionais estão por todos os lados numa guerra. A falência do humanitarismo não seria algo exclusivo do Coronel Kurtz. Ele simplesmente chegou num ponto onde todos nós poderíamos chegar, como bem aponta um dos personagens. Todos nós temos nossos limites, Kurtz apenas chegou ao seu. Teria ele enlouquecido? Ou apenas percebeu que durante toda sua carreira, tudo o que ele fez foi servir a uma causa sem fundamento algum? Perguntas como essa vão ficando cada vez mais pertinentes de acordo com que o filme vai se aproximando do seu final.

Além de todas essas discussões, “Apocalypse Now” ainda é uma aula de técnica cinematográfica. Não é preciso analisar muito. Basta assistir cenas de bombardeio ao som de “Cavalgada das Valquírias”, do compositor Richard Wagner (1813-1883), ou se atentar na fotografia espetacular de Vittorio Storaro, que faz uso das cores quentes para aquele ambiente. Além da trilha sonora espetacular, que se inicia com uma das seqüências mais memoráveis do filme, ao som de “The End” da banda The Doors. E claro, o trabalho visceral de Martin Sheen, num papel que foi disputado entre Nick Nolte, Harvey Keitel, Jeff Bridges, dentre outros. Algo que não saiu barato. Por conta do impacto das gravações, Sheen chegou a sofrer um ataque cardíaco. Algo até menos impressionante se comparado ao próprio Coppola, que tentou suicídio três vezes (!). Por sinal, “Apocalipse Now” possui tantas histórias de bastidores, que acabou resultando num documentário lançado em 1991, dirigido pela esposa de Coppola. Ele, aliás, lançou em 2001 uma versão Redux da obra, contendo quase uma hora a mais de cenas inéditas.

Fica difícil não ficar com “Apocalypse Now” na cabeça após assisti-lo. São tantas razões para considerá-lo, no mínimo, um dos documentos mais realistas de seu tempo, que pouco nos resta senão dizer que Coppola deixou uma verdadeira aula DO QUE É fazer cinema.

3 comentários:

  1. Me pergunto porque raios não assisti esse filme ainda?!

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  2. Oi Adécio!
    interessantíssimos os teus comentários sobre este filme. O conheço apenas de nome e embora filmes com a temática de guerra não sejam os meus preferidos, tenho certeza que vale a pena conferi-lo. Achei curioso como o próprio título do filme já trás elementos da própria produção, como você comentou: a tentativa de suicídio.. o narcisismo. Guerras de cada dia. ;)

    Um abraço!

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  3. Me pergunto porque raios não assisti esse filme ainda?!²

    Adecio, que cast forte nesse filme cara. Todos os caras são ao menos famosos hoje em dia.

    Fiquei curioso com esse documentário, poxa, tentativas de suicídio e ataques cardíacos. Violento!

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